Democracia sob Ataque: a Necessidade de Limites e a Defesa Implacável do Estado de Direito

A democracia, mais do que um sistema de governo, é uma construção histórica e jurídica que repousa sobre a premissa da convivência pacífica de diferentes ideologias, visões de mundo e interesses sociais. Em tempos de polarização política, essa convivência se torna ainda mais desafiadora, pois a radicalização dos discursos tende a corroer os canais de diálogo e a substituir a razão pelo confronto. Nesse cenário, reafirmar a centralidade do Estado Democrático de Direito é tarefa essencial, pois somente ele assegura a estabilidade institucional necessária para que as divergências se processem dentro das regras do jogo democrático.

A Constituição da República de 1988 consagra direitos e garantias fundamentais que conferem ao indivíduo um núcleo de proteção intransponível. Todavia, a dogmática constitucional e a própria jurisprudência pátria afirmam de maneira inequívoca que nenhum direito é absoluto. A liberdade de expressão, por exemplo, não pode servir de escudo para a incitação à violência, à subversão da ordem constitucional ou à propagação de ideologias que visem a destruição da própria democracia. O mesmo raciocínio se aplica a outros direitos fundamentais, que encontram limites na convivência social e na proteção do interesse público.

O Estado, por sua vez, não pode se manter neutro diante de ataques que tenham por objetivo minar as bases da democracia. A complacência institucional diante de práticas antidemocráticas equivale à erosão silenciosa do pacto constitucional. Cabe ao poder público agir de forma implacável contra aqueles que, valendo-se da própria liberdade conferida pelo regime democrático, pretendam instrumentalizá-la para destruí-lo. A experiência histórica, nacional e internacional, demonstra que os maiores colapsos institucionais se deram não apenas pela força de grupos autoritários, mas também pela inércia das instituições democráticas em reagir a tempo.

Assim, a defesa da democracia em tempos de polarização exige firmeza e racionalidade. Firmeza para impor a força normativa da Constituição frente a qualquer tentativa de ruptura da ordem jurídica; racionalidade para não confundir oposição política legítima com práticas que efetivamente atentem contra o Estado de Direito. A resposta estatal deve ser equilibrada, mas jamais tímida, pois a democracia não se esgota em uma formalidade eleitoral, e sim em um compromisso cotidiano de respeito às instituições, à lei e à convivência plural. O que está em jogo, em última análise, não é a vitória de um grupo político sobre outro, mas a preservação do espaço comum onde todas as disputas legítimas podem existir: o próprio regime democrático.

Esse é o verdadeiro imperativo do nosso tempo: reconhecer que direitos fundamentais são amplos, mas não ilimitados, e que a democracia, embora aberta à crítica e à divergência, não pode tolerar a ação daqueles que, sob o pretexto de exercê-la, pretendam destruí-la por dentro.

GELSON TOMIELLO, OAB/SC 45.295, advogado.

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